Pular para o conteúdo principal

João Delfiol Construções

João Delfiol Construções

RETROSPECTIVA DO BLOG

Criado com o Padlet

50 anos... hora de ser feliz

 

Olho-me no espelho. Sempre fiz isso. Acordar bem cedo, tomar meu banho e antes de pôr a roupa, aquele tempo demorado diante do espelho, o ritual matutino: a maquiagem. Primeiro um creme para limpar a pele, depois um hidratante, uns truquezinhos para disfarçar as olheiras, que sempre tive, com preocupação, sem preocupação, com menstruação, sem menstruação, dormindo bem ou não. O blush para me deixar mais alegre, mais corada, disfarçando um pouco a pele branquíssima. O rímel para deixar meus cílios finos, mais grossos, meu olhar mais profundo, claro, um delineador também. A sombra para acentuar meu olhar, meus olhos grandes, azuis, como o azul do mar, como diria mamãe. Um batom vermelho, porém um tom mais discreto, mas que aumenta os meus lábios, um pouco finos. Um brilho, ou gloss, como se chama agora. Enfim, olho-me, reconheço-me. Ou melhor, reconhecia-me.
Hoje faço 50 anos... e agora?
Observo-me no espelho, agora maquiada, pronta para o trabalho. Mas estarei pronta para enfrentar esta nova etapa de minha vida?
Não vejo mais o rosto lisinho, atraente da jovem de outrora. Por dentro sinto-me a mesma jovem alegre, feliz, apaixonada pela vida, que adora sentir o sol na pele, o vento no rosto, a areia da praia nos pés, a música a embalar meus passos. Mas quem é esta que vejo agora diante de mim? Quem é esta mulher no reflexo do espelho a desafiar-me?
Ainda encontro no rosto desta mulher, traços da jovem, no olhar azul um sonho não realizado, um amor impossível não vivido.
Fecho o armário. Some o espelho, a imagem, o desafio. Termino de me vestir rapidamente, porque o tempo passa tão rápido, tão fugaz.
Entro no meu carro, coloco uma música e dirijo rumo ao escritório... mas instintivamente paro próximo à praia. Desligo o carro. Saio. Começo a andar despreocupadamente pelo calçadão, como se fosse feriado, como se estivesse no meu primeiro ou no último dia de férias, como se fosse morrer amanhã: guardar esse momento, essa paisagem nas minhas retinas pra sempre!
Assim ando, feliz, despreocupada, olhando as pessoas que passam por mim.
De repente... uma surpresa! Fecho os olhos! Sinto meu coração bater rápida e doidamente de novo. O ar me falta! O corpo trêmulo. A mente confusa. A visão da adolescente apaixonada: o beijo inesquecível, o amor impossível. Eu, filha de pobres agricultores; ele, filho de ricos fazendeiros, tradicionais, família de nome e muitos sobrenomes. Nosso namoro foi proibido pelas duas famílias. A minha, a mais fraca, se mudou para bem longe, outras terras, outras fazendas.
Sim. É ele. Jamais esqueci aquele rapaz moreno, alto, cabelos negros e encaracolados, aqueles dentes branquíssimos, o sorriso farto.
Paramos. Olhamo-nos por um momento. Um tempo longuíssimo: tantas lembranças! Um filme passa em minha mente. Acredito que na dele também.
— Você é a Ana!?
— Sim, você ainda se lembra?
— Claro, nunca esqueci. Como você está? Casou? Teve filhos? Mora aqui perto?
— Casei. Meus filhos já estão adultos, casados, cuidando de suas vidas. Moro perto, mas na verdade estava a caminho do trabalho, quando fui magicamente impelida pra cá.
— Mas me fala... e o seu marido?
— Você não ficou sabendo? Claro que não... desculpe. Ele morreu há 5 anos atrás... foi muito difícil, mas superei.
Conversamos por mais algum tempo. Ele me contou que também havia se casado, tivera filhos, mas que estava separado já há alguns anos. Não foi feliz!  Trocamos telefones, e-mail, orkut, skype, twitter... todas as formas de comunicação possíveis para não nos perdermos mais.
Volto pra casa. Depois desta caminhada pela orla, acompanhada pelo jovem, aos meus olhos, agora meio grisalho, mas  não menos bonito, nem menos sedutor, príncipe dos meus sonhos. Estou renovada!
Volto ao espelho! Olho-me, reconheço naquela imagem real, atual, um brilho novo, uma nova esperança.
50 anos... e agora?
Hora de escrever uma nova história ou retomar uma história interrompida. Hora de ser feliz!

(Texto enviado para o 4° PRÊMIO UFF DE LITERATURA  -     CONTOS, CRÔNICAS E POESIAS - 2010) 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Dicas sobre provas para eliminação de matérias e ENCCEJA E ENEM

Escrevi uma postagem com dicas para concurseiros de primeira viagem, mas analisando os atendimentos diários que faço no meu trabalho, pensei em escrever outro(s) texto(s) com dicas ou orientações sobre outros assuntos, pois mesmo com tanta informação disponível, as pessoas continuam sem conhecimentos básicos, que podem ajudá-las a resolver problemas simples do seu cotidiano, que vão desde onde procurar a informação, como também onde cobrar seus direitos. Para começar esta série de textos, vou falar um pouco das provas para eliminação de matérias. As pessoas buscam muito este tipo de avaliação, na qual, desde que atinjam as médias, eliminam todo o ensino fundamental ou todo o ensino médio. Para quem pretende eliminar o ensino fundamental - Ciclo II (antigo ginásio, 5ª a 8ª série, 6º ao 9º ano atualmente) poderá fazê-lo por meio do Encceja, que é uma avaliação de eliminação de matérias, ou seja, o candidato pode ir eliminando áreas (Linguagens e Códigos, Ciências da Nat...

Rio Lavapés e as obras do Parque Linear em Botucatu, SP

  Dia 22/10 p.p. resolvi sair para andar um pouco por aí e tirar algumas fotos, coisa que não fazia há bastante tempo. Essa minha incursão foi, principalmente, margeando o Rio Lavapés, em Botucatu, parando em pontos estratégicos, onde existem pontos, nas quais poderia ficar e fotografar o entorno do local, tanto o rio acima e abaixo da ponte, quanto o entorno registrando se há muitas ou poucas casas e prédios. O rio vem passando por obras desde o primeiro semestre de 2020 (aproximadamente), quando ocorreram fortes chuvas na cidade, que foram noticiadas na mídia, que trouxe sérios transtornos para os moradores, que duraram por meses e meses. Foram levadas, segundo notícias da época, cerca de quarenta (40) pontes entre urbanas e rurais, além de casas próximas ao rio, que foram danificadas. As pontes foram reconstruídas pela Prefeitura (vide links de notícias da época), segundo notícias da época, que esclarecem a respeito dos recursos públicos utilizados nessas obras. Ainda há...

Corações gélidos!

  Aos governantes por aí, que acreditam que em qualquer época do ano, a frequência do alunado DEVE SER perto dos 100%... Caros senhores, aqui quem vos fala é alguém que se encontra com os pés, cabeça e o coração no chão da escola, que mesmo, em anos anteriores, atuando em outras funções na educação pública, nunca deixou de ter um contato frequente e regular com unidades escolares muito diversas entre si. Dito isto, vou   abordar aqui quem são os alunos da escola pública. Temos uma clientela bem variada, desde alunos de classe média até alunos menos favorecidos financeiramente. Vou falar destes últimos! Vou falar deles, porque eles, assim como eu, sabemos o que é passar muito frio! O que é ter que acender uma tampa de tambor de ferro no chão da cozinha para fazer uma fogueira e se aquecer nas madrugadas gélidas do sul do País, para só depois poder ir para a cama e tentar dormir. Também sei o que é só ter uma coberta e precisar enrolar os pés com jornal e colocá-los dent...